Muito tem se falado sobre aderências abdominais e cirurgias complexas.
Muito tem se falado sobre aderências abdominais e cirurgias complexas. Um caso de repercussão pública que ilustra bem essa condição é o do ex-presidente Jair Bolsonaro, que passou por diversas cirurgias abdominais. Desde então, apresentou múltiplos episódios de obstrução intestinal relacionados à formação de aderências, tendo sido internado diversas vezes para tratamento clínico e cirúrgico. Trata-se de um exemplo real das possíveis consequências tardias das aderências.
As aderências são faixas de tecido cicatricial que se formam dentro do abdome, ligando órgãos que normalmente não estariam conectados. Elas surgem após inflamações ou lesões na membrana que reveste os órgãos abdominais, chamada peritônio. Essas “pontes” fibrosas dificultam a movimentação natural dos órgãos e, em casos mais graves, podem levar à obstrução intestinal.
A principal causa de aderências são as cirurgias abdominais, especialmente quando envolvem contaminação por sangue, fezes ou pus. Estima-se que até 93% dos pacientes que passam por laparotomias desenvolvam algum tipo de aderência. Outras causas incluem infecções (como apendicite e peritonite), doenças inflamatórias pélvicas, endometriose e traumas abdominais.
Em situações raras, a inflamação pode levar à formação de uma cápsula fibrosa espessa que envolve o intestino delgado, condição chamada peritonite encapsulante. Essa “embalagem” do intestino impede seus movimentos, causando obstruções intestinais recorrentes e requerendo atenção médica especializada.
Aderências simples podem ser assintomáticas, mas quando comprometem o funcionamento de órgãos, provocam sintomas como:
As complicações incluem obstruções intestinais recorrentes, infecções, isquemia intestinal e necessidade de reoperações complexas, que envolvem riscos elevados, inclusive de morte, em casos extremos.
Nos casos leves, o tratamento é clínico, com controle da dor, ajustes alimentares, uso de laxativos, anti-inflamatórios e monitoramento nutricional. Já nos casos graves, com obstrução ou risco de perfuração, a cirurgia é necessária. O procedimento, chamado adesiólise, busca liberar as aderências ou, na peritonite encapsulante, remover a cápsula que envolve o intestino. No entanto, esse tipo de cirurgia é desafiador e de alto risco, pois há chances de lesionar órgãos envolvidos.
As aderências abdominais são comuns após procedimentos cirúrgicos e, em muitos casos, não causam sintomas. Mas quando provocam obstruções ou dor intensa, exigem avaliação médica cuidadosa. A peritonite encapsulante, embora rara, representa um grau mais severo da reação inflamatória e requer tratamento especializado. A chave para o sucesso no manejo dessas condições está no diagnóstico precoce e na atuação de cirurgiões experientes em doenças do aparelho digestivo.
*Por Antonio Couceiro Lopes (CRM 100656 SP | RQE 26013)
Cirurgião do Aparelho Digestivo